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terça-feira, 15 de novembro de 2011

Albert Pujols não está para brincadeira

Reproduzo matéria de Tim Keown, publicada na Revista ESPN nº 25 novembro/2011




REBATEDOR MAIS TEMIDO DA MLB E SEM CONTRATO PARA A PRÓXIMA TEMPORADA, O DOMINICANO LEVA O TRABALHO HUMANITÁRIO EM SEU PAÍS TÃO A SÉRIO QUANTO O BEISEBOL


FOTO: Brian Snyder / Reuters




ALBERT PUJOLS EMANA sobriedade e responsabilidade, dos olhos penetrantes à barba aparada cuidadosamente, como o gramado de um clube de campo. Tem o porte de um embaixador, ereto e estoico, quase de realeza. Transpira circunspecção. Não sabe explicar porque sempre está tão sério; não conseguiria nem se fosse de muitas palavras, o que assumidamente não é. Então mantém a resposta em termos profissionais, discutindo seu trabalho e sua responsabilidade com os companheiros e a enorme quantia de dinheiro que ganha dos donos do St. Louis Cardinals para jogar na primeira base e impulsionar corridas. "Não se brinca em serviço", diz. "Estou sendo muito bem pago para jogar, e sei que as pessoas esperam muito de mim. Se você está sentado em um escritório, comanda 200 funcionários e não dá um bom exemplo a eles, acha que vão te respeitar? Não."

É o rebatedor mais temido do beisebol, um homem cuja produtividade ofensiva é medida não por seus colegas, mas pela História. Se repetisse anualmente no decorrer de uma longa carreira os números da sua pior temporada regular, a deste ano - 29,9% de rebatidas válidas, 37 home runs e 99 corridas impulsionadas - tais números fariam de Pujols um membro certo do Hall da Fama.

Talvez o aspecto mais notável de sua consistência possa ser encontrado no turbilhão de medo que Pujols, de 1,90 m e 104 kg, impõe sobre arremessadores adversários quando se posiciona com sua característica cara fechada. "Se você cometer um erro por, digamos, 15 centímetros, ele o esmagará", diz o fechador dos Padres Heath Bell. "Então, minha abordagem é: Não deixe que ele me bata." Os totais de walks de Pujols aumentaram quase todo ano, atingindo 115 em 2009, e ele entra em cada jogo sabendo que só receberá um número limitado de arremessos de qualidade - por erro ou necessidade. Não há rebatedor - nem Matt Holliday, dono de um contrato de sete anos com o Cardinals para ser o principal protetor de Pujols - que um arremessador tema mais do que Albert. "Acho que Albert estaria levando um walk se Babe Ruth estivesse arremessando atrás dele", diz Holliday.

Quando se sugere que ele pode receber dois ou três desses arremessos por erro ou necessidade a cada quatro ou cinco oportunidades no bastão, Pujols diz: "Tantos assim? Ah, adoraria." Esta escassez de oportunidades explica, em parte, porque Pujols é tão sério. E ele é perfeitamente sério, pelo menos na teoria. Contabiliza as variáveis - arremessador, situação, probabilidade de ser desafiado - e pratica até a perfeição. "É possível ter sucesso em 10 de cada 10 vezes?", pergunta. "Não, mas treino para 10 em 10. Treino para a perfeição."

O FARDO DA RESPONSABILIDADE recai pesadamente sobre Pujols. Faz 32 anos em janeiro, mas sempre foi velho demais para a idade. Crescendo na República Dominicana, parte de sua responsabilidade como filho único era tirar o pai das ruas de Santo Domingo, depois de uma longa noite de bebedeira, e levá-lo para casa. Conheceu Dee Dee Corona quando tinha 18 anos, e ela era mãe solteira de Isabella, que tem síndrome de Down. Albert se apaixonou pelas duas. Ele se casou com Dee Dee aos 19 anos e, agora, tem quatro filhos.

A grande motivação de Pujols é conciliar sua incrível fortuna com a injustiça a seu redor. Ajudar os mais pobres em sua terra natal, levar alegria a quem mora às margens da sociedade. "Recebi uma responsabilidade", afirma Pujols. "Há muita necessidade."

No início de 2007, uma bebê morta chegou enrolada em um cobertor nos braços do pai, em uma rua sem asfalto de um bairro esquálido em Batey Alemán, na República Dominicana (bateys são favelas perto de campos de açúcar onde os trabalhadores vivem). A mãe estava alguns passos atrás, e seus gritos desconsolados anunciavam sua chegada: tinham acabado de visitar um curandeiro a alguns quarteirões dali. Tambores foram batidos e pétalas de flores jogados sobre o corpo mole da pequena. Eles saíram e foram para as ruas, procurando ajuda. Encontraram Dee Dee, Todd Perry e uma equipe de filmagem em uma missão humanitária da Pujols Family.

Um médico de uma clínica próxima fez reanimação cardiopulmonar já sabendo da terrível verdade. Estimou que a bebê estava morta havia 20 minutos. Um vírus transmitido pela água causou uma diarreia incontrolável, que levou à desidratação e à morte. "Uma garrafa de Gatorade", diz Albert baixinho. "Uma garrafa de Gatorade a teria salvado."

Albert não estava lá, e sim em uma clínica odontológica improvisada na vila com dentistas que havia trazido dos EUA. Mas a criança também é parte dele, da mesma forma que a mulher paralisada que chorou e o abraçou quando ele levou sobre a cabeça um colchão até sua casa na favela. "Albert e Dee Dee ficam entre as pessoas - com piolhos, com sarna, já vimos até leprosos. Não são o tipo de gente que diz: 'Vocês cuidam disso que fiaremos na piscina'", diz Perry.

A maioria dos moradores de favela em Santo Domingo é haitiana, está ali para trabalhar nos campos de cana, e vive em privação contínua: sem encanamento interno, sem água corrente, subnutrida, com pouquíssimo atendimento médico ou conhecimento sobre como utilizá-lo. Pujols faz pelo menos uma viagem por ano até as favelas. Já levou dentistas e oftalmologistas, que fizeram exames e deram óculos para crianças que sempre pensaram que todos veem as mesmas formas borradas quando abrem um livro (depois do terremoto que devastou o Haiti em 2009, sua fundação trabalhou com a Compassion International para arrecadar dinheiro para auxílio).

Os Cardinals foram homenageados na Casa Branca depois de vencer a World Series de 2006. Pujols faltou à homenagem porque coincidia com uma visita planejada à Batey Alemán. No ano retrasado, sua fundação ganhou o prêmio de Serviço Comunitário e Necessidades Humanitárias do Salão da Fama dos Esportes de St. Louis, mas ele faltou ao banquete porque conflitava com a abertura de um centro de bem-estar para adultos com síndrome de Down.

Em 2009, o baile de debutante que ele promove anualmente para portadores de síndrome de Down com mais de 16 anos foi agendado para dois dias depois da cirurgia de Pujols para remover fragmentos de osso do cotovelo direito. Perry sugeriu que ele faltasse em vez de se arriscar a sofrer um encontrão ou ser agarrados por debutantes exuberantes. Pujols simplesmente respondeu: "É minha noite preferida do ano".